Homens de fato, sempre de
telemóvel na mão, a andar em passo apressado. Também eu já fui um viciado em
trabalho. Só nunca me viciei no poder.
Um casal que discute no meio
da rua. As pessoas preferem discutir em vez de falar civilizadamente. E muitas
vezes discutem por coisas mínimas. Já eu, só posso discutir comigo mesmo.
Sinto qualquer coisa a
bater-me nos pés. Olho para baixo e vejo uma bola. À minha frente está um miúdo
franzino, que olha para mim, imóvel. Parece assustado. Pego na bola e
estendo-lhe a mão, com um sorriso. Continua sem sem mexer. Mais
dois miúdos surgem, a correr. "Pega na bola e deixa esse
velho.", disse um deles e o outro riu-se. O menino assustado tirou a bola
da minha mão e juntou-se aos outros dois, sem sequer dizer um
"obrigado".
"Deixa esse
velho". A maneira como o rapaz disse aquilo magoou-me. Senti-me como
alguém inútil, que não merece ser visto ou ouvido. Estou velho e gasto e, por
isso, ultrapassado. Sou uma pedra no sapato para a sociedade.
Estes pensamentos são
interrompidos quando uma menina corre na minha direcção. Parece um anjo caído
do céu. O sorriso dela enterneceu-me. Disse-me "olá" e eu fiz o
mesmo, com a minha voz rouca. Pegou na minha mão com as suas e disse:
"Avó! Avó! Encontrei o avô!". A avó dela, uma mulher coberta de
toneladas de maquilhagem para esconder a idade, pegou na mão dela bruscamente,
separando-me a mim e à menina.
"O avô está no céu, já
te disse. Vamos embora!"
"Mas eu quero o
avô!" - chorou e berrou a menina.
Dizem que os homens não
choram, mas é mentira. Não pude deixar de verter uma lágrima de emoção. Gostava
de poder ser o avô daquela menina mesmo que fosse a fingir.
Levanto-me do banco com a
ajuda da bengala e começo o trajecto vagaroso até casa. Tenho 80 aos de idade e
não posso fazer o tempo voltar atrás e mudar o que está errado. É tarde para
mim. Espero que não seja tarde para este mundo.
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"Prolongar a juventude é desejo de todos, desfrutar de uma velhice sadia é sabedoria de poucos"